Há uns três dias eu tenho Milton na minha cabeça. Eu sei, é por causa de Catarina e seu maravilhoso Mundo Bita. Mas ainda assim.
Todo mundo conhece a canção:
Há um menino, há um moleque. Morando sempre no meu coração. Toda vez que o adulto balança, ele vem pra me dar a mão.
Há um passado no meu presente. O sol bem quente lá no meu quintal.
Toda vez que a bruxa me assombra, o menino me dá a mão.
Olhando para trás dos meus 30 anos, dá pra ver claramente quem está nesse quintal.
Tem um João magrelo pulando pra lá e pra cá, fingindo fazer uma bandeja — ou até mesmo ousando uma enterrada — e sempre gritando “Kobe Bryyyyyant!”
Tem uma Dona Maria — minha tão amada vó — com seus 80 e tantos anos, subindo a escada para o primeiro andar para assistir um jogo da NBA com o neto: “é cada lapa de braço, né”. Vocês não imaginam o quanto ela ficou feliz quando num sábado de All-Star Weekend, o Palomino mandou um “salve” pra ela: “Acordada essa hora, Dona Maria? Amanhã o café sai tarde!” (na época a gente participava mandando e-mail para a ESPN, não tinha twitter e hashtag).
Tem minha mãe abrindo a porta do quarto e não acreditando que tô acordado vendo Lakers e Timberwolves pela final do oeste mesmo tendo avaliação no outro dia.
Tem todos meus colegas do colégio com ídolos como Ronaldinho Gaúcho, Kaká, Ronaldo. E eu com Kobe desenhado na contracapa do meu caderno. Gontijo, um de meus colegas, um dia me disse, obviamente em tom de brincadeira: “Porra de Kobe Bryant, Lima! Aqui é Brasil! Ronaldiiiiiiinho”.
Tem na minha cabeça o local exato que eu tava no dia dos 62 pontos em três quartos contra o Dallas Mavericks: num quartinho que tínhamos onde ficava o computador — porque na época Wi-Fi, notebook, smartphone e tablet era algo que ninguém sonhava. Ouvia o jogo na KVTA, num calor desgraçado — porque o quarto nem janela tinha. No jogo dos 81, eu tava em Mauá passando as férias na casa dos meus tios.
2000, 2005, 2010, 2015, 2016… metade de uma vida acompanhando a carreira de Kobe Bean Bryant. A matéria quase reprovada nas finais de 2008. A felicidade das finais de 2009 e 2010. A estranha previsão dos 60 pontos no jogo da aposentadoria em 2016.
Centenas de textos lidos, podcasts ouvidos, e algumas palavras escritas sobre ele. Kobe esteve presente em diversos momentos. Me ajudou a crescer, a aprender inglês e, o mais importante, a construir muitas amizades e momentos.
Então ele partiu. Mas não foi embora. Ele tá nesse quintal até o dia que eu esqueça meu próprio nome. E tenho certeza que não é exclusividade minha.
Vá em paz, Kobe Bean Bryant. Descanse em paz. Você e sua Gigi.
E obrigado por tudo.